quinta-feira, 20 de maio de 2010

Um conto.

Era uma noite quente e estrelada, do lado de fora da casa, a menina olhava o velho album, as fotografias já amareladas pelo tempo. O cheiro de grama, a canção dos grilos ao longe, tudo a fazia lembrar dos rostos nas fotos. O Pai, a mãe, o irmãozinho...
Ela estava sentada debaixo da velha árvore, a mesma que ela plantou no dia do nascimento de seu irmão.
O calor da noite envolvia seu corpo de uma forma suave, de modo que o suor que exalava misturava-se com o perfume, criando, assim, um aroma com um toque venenoso.
Perdida entre as memórias de seu passado, algo, de repente, a fez sair de sua viagem pelo torvelinho da memória e voltar ao lugar onde estava.
Um homem a olhava, pela penumbra da lua, ela só conseguia ver o reflexo das estrelas naquele olhar azulado.
- Você veio. - disse a moça sem tirar seus olhos do álbum.
O rapaz não falou nada, apenas deslizou para o lado da moça, sentando-se ao lado da mesma e começou a admirar as fotos.
- Esse foi o aniversário de casamento dos meus pais. - disse a moça parando em uma das fotos. - Foi o dia mais lindo da vida deles. Estavam felizes, sorriam, nunca os vira daquela forma, pareciam que o casamento deles acabara de acontecer.
O homem continuou em seu silêncio, apenas olhando as fotos, seu braço deslizou suavemente por trás da cabeça da moça, pousando no ombro oposto. Quem por ali passasse pensaria que eram um casal apaixonado.
- Nesse dia, meu irmão me deu um presente lindo, foi o dia em que ele me deu esse pingente.- disse a menina tirando a pequena letra de brilhante e mostrando ao rapaz.
O rapaz continuou em seu silêncio, apenas observando os detalhes do rosto da menina. Os olhos cor de mel dela estavam fixos no álbum, as sobrancelhas em seu desenho perfeito estavam baixas, como se uma memória ruim tivesse resolvido aparecer na mente da moça.
- Esse dia... - começou a menina.
- Não precisa dizer que dia foi esse. - Manifestou-se o rapaz. - Me lembro bem do que aconteceu. - disse ele em sua voz suave.
- Por que tão cedo...
- Não somos nós que escolhemos nossa hora, mas a nossa hora que nos escolhe. - pela primeira vez o olhar dos dois havia se cruzado, o mel e o azul foram tão intensos que um leve arrepio subiu pela espinha da moça.
- Só queria poder revê-los.
- Sua hora ainda não chegou. - disse o rapaz encostando seus cabelos desarrumados no rosto da menina.
Ela se aconchegou no peito do rapaz.
- Eu sinto a falta deles.
- A morte sabe o que faz. - com isso ele se levantou, beijou a testa da moça. - Um dia você os reverá, e nesse dia, também ficaremos juntos.
- Você promete?
- Dou minha palavra de honra.
O menino deu de costas para ela,tomou impulso no chão e flutuou em direção à lua.
A menina continuou ali sentada, observando a última foto do álbum, seu pai, sua mãe, seu irmão, ela e um outro rapaz, seu eterno amante, o anjo da morte.

Um comentário: